Título: Minha
Metade Silenciosa.
Título original: Stick.
Autor: Andrew
Smith.
Editora: Gutenberg.
Nº de páginas: 304.
Sinopse: Stark
McClellan tem 14 anos. Por ser muito alto e magro, tem o apelido de Palito, mas
sofre bullying mesmo porque é “deformado”, já que nasceu apenas com uma orelha.
Seu irmão mais velho, Bosten, o defende em qualquer situação, porém ambos não
conseguem se proteger de seus pais abusivos, que os castigam violentamente
quase todos os dias. Ao enfrentar as dificuldades da adolescência estando em um
lar hostil e sem afeto – com o agravante de se achar uma aberração –, o garoto
tem na amizade e no apoio do irmão sua referência de amor, e é com ela que
ambos sobrevivem. Um dia, porém, um episódio faz azedar terrivelmente a relação
entre Bosten e o pai. Para fugir de sua ira, o rapaz se vê obrigado a ir embora
de casa, e desaparece no mundo. Palito precisa encontrá-lo, ou nunca se sentirá
completo novamente. A busca se transforma em um ritual de passagem rumo ao amadurecimento,
no qual ele conhece gente má, mas também pessoas boas. Com um texto
emocionante, personagens tocantes e situações realistas, não há como não se
identificar e se envolver com este poético livro.
Nota
Pessoal:
Se tem uma coisa que eu preciso falar – ou escrever – antes de colocar
em palavras os sentimentos que me acometeram durante a leitura deste livro, é
que Andrew Smith é um autor que consegue – de uma maneira bem particular, é
verdade – colocar sentimentos verdadeiramente cruéis em sua narrativa – ao
menos neste livro. Preciso dizer isso porque não foram muitas as histórias que
me pareceram tão cruéis, mas ao mesmo tempo temperados com sentimentos tão bons
e esperançosos. O autor, que de longe se saiu melhor do que o esperado ao
escrever esta história que a sinopse poderia sugerir ser ‘clichê’, me deu novas
perspectivas de vida, sofrimento, amor, amizades e acima de tudo, esperança. Minha Metade Silenciosa é uma ficção tão real quanto à própria
estrutura física do livro. E isso é apenas um elogio que não se pode comparar
ao que a história realmente é.
A história do garoto Stark – chamado e conhecido por Palito – é mesmo
bem triste. Não apenas triste, mas um golpe de ‘não sorte’ bem cruel. Contada
pelo próprio, ao abrir o livro, o leitor já vai se deparar com uma narrativa
bem crua, sem pudores e totalmente permeada por doses exageradas de sentimentos
- de uma maneira positiva - tanto bons, quanto ruins. O modo como o Stark conta
sua história é também outra particularidade da narrativa: ele oferece pausas
necessárias para que o leitor ouça o mundo como ele próprio o ouve.
Calma, eu explico. O menino só tem um ouvido. O seu direito é apenas uma
‘forma de orelha’ comprimida contra sua cabeça. Ele não tem a orelha direita e
não ouve nada por esse lado. Ou seja, sua única forma de ouvir o mundo é com
seu ouvido esquerdo e isso dá ao garoto alguns poucos momentos de silêncio que
ele faz questão de que sejam ouvidos por quem se deu a oportunidade de ler.
Stark nasceu numa família complicada e as únicas pessoas no mundo que
parecem se importar com ele é sua amiga Emily e seu irmão Bosten – este último
o verdadeiro companheiro do garoto. Ele tem pais que fumam, bebem e batem nele
com a mesma frequência. A vida dele parecia seguir uma rotina dolorosa até o
dia que Bosten resolve começar a quebrar as regras e levar o menino para
algumas ‘aventuras’ proibidas.
Só que essas aventuras trariam consequências que marcariam ainda mais a
falta de um lar e de ‘pessoas que se importassem’ na vida de Stark. Mas não é
só isso. O garoto ainda nutre um sentimento confuso pela amiga Emily – e tem de
lidar com isso da melhor maneira que um garoto de 13 anos lidaria. Ele não sabe
o que fazer, mas sabe que Emily é alguém que ele quer sempre ter por perto.
Em meio a tudo isso, Stark se vê num mundo conturbado e cheio de brigas,
preconceitos – basicamente por ele ter essa ‘deficiência’ – e de coisas que
parecem valer minimamente a pena, como a proteção de Bosten e o amor de Emily.
Tudo muda quando ele e o irmão são mandados para a casa da tia Dahlia. O
que os irmãos não esperavam era que lá, nas praias californianas e na casa
aconchegante de um parente distante, eles fossem encontrar um lar. Um lar de
verdade, com uma tia amorosa, uns amigos surfistas super maneiros e uma
esperança em meio ao caos que é a casa deles. E tudo torna a mudar quando
Bosten foge de casa depois de uma briga com o pai. É aí que se inicia uma busca
frenética, desesperada e que reserva grandes surpresas para Stark.
Falando assim pode parecer um pouco ou exageradamente simples, mas
acredite em mim, não é. O livro é complexo e cheio de situações embaraçosas que
deixam no leitor a sensação de que ‘eu preciso fazer alguma coisa’. Apesar de
ter apenas 13 anos, o Stark – embora ele se coloque como ‘Palito’ o tempo todo
– é um adolescente muito forte. E a característica mais marcante do personagem
é essa vontade de mudar misturada com medo.
O desenvolvimento do livro traz os pormenores da amizade e
companheirismo entre Stark e Bosten. Das aventuras, frustrações, segredos e dos
sonhos compartilhadas. E essa amizade é tão bonita! Bosten, a seu jeito,
defende Stark de todos que o olhem torto ou façam piada da situação do garoto;
a forma como ele se sente em relação ao mundo e ao irmão mais novo é
indescritível. Já o Stark ama o irmão tão incondicionalmente que não o nega
nada, nem mesmo a oportunidade de Bosten consumir drogas para fugir de todo o
sofrimento. O menino parece encarar o mundo a sua própria maneira, sem pudores,
dirigindo carros, parecendo forte, tentando se convencer de que é feio, mas que
no fundo sabe que é alguém que quer ser apenas comum e ter pais comuns; viver
uma vida ‘comum’.
Minha
Metade Silenciosa discute
temas fortes, sérios e que vêm se tornando necessários. Eles vão desde a
negligência dos pais, até a sexualidade, puberdade, consumo de drogas e a
descoberta do próprio corpo. E o autor soube trazer essas discussões à tona aos
poucos e de uma maneira bem estruturada, concreta e verossímil. Ao longo das
páginas, Andrew Smith se mostra mestre na arte de chocar o leitor e fazê-lo
pensar. E não é apenas isso: ele oferece a oportunidade do leitor se envolver
tão profundamente a ponto de querer, de alguma forma, mudar o rumo da história.
Resumi-lo num livro ‘triste’ seria um exagero. São tantas as pessoas
boas que o Stark descobre. É um mundo tão cheio de possibilidades e sem regras
tão severas e punições tão dolorosas fora de casa. Assim como aos pouquinhos o
autor dá ao protagonista a chance de um sofrimento que dependendo de cada um é
necessário ou não, ele também oferece a Stark pessoas boas e comuns que querem
apenas ajuda-lo sem esperar nada em troca. Andrew Smith oferece esperança tanto
ao seu personagem, quanto ao seu leitor.
Quando cheguei à última página do livro, ao ponto final, toda a história
do Stark passou-se pela minha cabeça. Toda sua trajetória, suas desilusões,
seus sonhos, as pessoas, o caminho percorrido, as barbaridades necessárias para
talvez encontrar o Bosten depois d’ele fugir. E por fim o que eu pude perceber
foi que ele nada mais era do que um garoto comum, com uma imensa capacidade de
amar e a inocência de alguém que tem esperanças. E embora não totalmente
inocente com relação à vida, ele ainda estava bem longe de saber ‘como as
coisas realmente são’.
Se me pedissem para resumi-lo em uma única palavra eu diria que o livro
é incrível. Incrível. Ainda
assim, acredito que ele esteja acima desse adjetivo. Muito acima.
Boa Leitura!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirÓtima resenha! Mais um para lista. Parabéns!
ResponderExcluirOi.
ResponderExcluirQue temáticas interessantes. Acredito que em breve terei que lê-lo. Assuntos como esses necessitam serem lidos e refletidos.Parabéns pela resenha.
Abraços.
http://musicaselivros.blogspot.com.br/